30.8.09

Talita Maria Marques Albuquerque de Talalacchio

- Mas que nome longo, menina!
Era sempre a mesma encheção de saco pra cima da guriazinha. Quando menor quisera usar sutiã para parecer com Camila Taísa, a moça mais velha. Deu que Talita Maria ficou de peito mais robusto que a irmã, uma ironia.
Talita Maria acordava todos os dias às 10 para às 9, tomava o desjejum - leite e biscoitos de araruta - e lia a coluna social do único jornal da pequena Santa Mãe do Progresso (que de progresso só tinha o nome). Aí corria ao redor da Lagoa da Imagem Bendita onde sempre se encontrava com Gerdes Bonifácio Lopes, um rapaz louro e de muitos sorrisos.
- Tais bonita nessa chita arroseada, Talita Maria!
- Coisa de teu olho, Gerdes!
Ruborizada que ficava, saia em disparada pro único chuveiro que ficava entre a casa de sua família, a de Dona Pompília e a da família Siqueira Pombo. Tomado o banho ia pra escolinha onde lecionava para crianças de tudo que era idade, porque na Santa Mãe do Progresso eles não tinham divisão etária pra séries escolares. Nem ao menos sabiam o que significava "etária".
Talita Maria gostava muito de ouvir o horóscopo que Juvenal Arqueiro narrava no fantástico radiojornal "Galo da Serrinha", um primor da comunicação. Dia desses pegou a seguinte previsão mágica:
- Tu, mulher de sagitário, tu mesma! O amor está onde menos espera, tu é que não te deixas ver direito. Ao olhar o mundo de verdade, perceberás o amor a te contemplar, mulher! Basta abrir os olhos. Cor de sorte: azul. Número: 17.
Não é que se encaixou? Terça-feira amanheceu 17 de outubro e Talita Maria foi fazer o ritual matutino. Tirou do varal o vestido mais bonito de cetim paulista da cor azul turquesa que chegava a latejar a cabeça de tão forte. Partiu rumo a Imagem Bendita. Caminhando meio desconfiada, crente que ia achar seu amor naquele momento, Talita Maria encontrou Gerdes Bonifácio Lopes a colher flores do canteiro da fazenda Menino Jesus Santíssimo.
- Valha-me, Deus! Só podem ser pra mim!
Num assobio deveras galanteador, chamou Gerdes Bonifácio Lopes e o encarou por dentro dos olhos. Agarrando-o firmemente pelos ombros tascou-lhe um beijo molhado desses de selar carta e não soltou por uns vários 10 minutos.
- Talita Maria Marques Albuquerque de Talalacchio Lopes? Mas que nome longo, mulher! - era o que todos lhe diziam depois que casou-se com Gerdes Bonifácio.
O que Talita não sabe e nunca haverá de saber, é que quem escrevia o horóscopo era a Dona Pompília Arqueiro, mãe de Juvenal e sua vizinha, uma senhorinha ruiva que nunca havia visto sequer estrela cadente. E Talita Maria também não sabe que as flores que Gerdes Bonifácio Lopes, agora seu esposo amado e estimado, colhera naquela tarde em questão, eram pra alimentar a vaquinha Lulu que virara churrasco de domingo no quintal da família Siqueira Pombo.
Talita Maria era mesmo uma moça robusta de muita sorte.

25.8.09

Mudando de assunto

Às vezes pego pra ler esse blog e fico chateada por eu ser tão monocromática e... chata. Sério, gente. Sei que sou chata.
Mas, dentre tantas decisões, está firmado que não usarei mais este espaço para ficar chorando e amargurando os meus dramas infantis. Alô? Tá na hora de morfar.

Eu e minha bróda, assim a chamarei, decidimos várias coisas nesse fim de semana. Na verdade ela concordou com os meus planos feitos numa sexta-feira alucinada.
Bom, são coisas bestas pra quem ouve, mas têm me dado um certo ânimo. Óbvio que envolvem dinheiro, trabalho, sangue, suor e saibro, mas tranquilo. Chega um dia que você se sente deslocada e ninguém pode fazer nada por você a não ser... você. E é isso que vai ser. Oh, só! Tô até sorrindo aqui.

Enfim, tinha me prometido que não ia mais surtar nos meus pensamentos e quando eu visse que essa droga ia começar, caçaria dramins na geladeira (sim, em casa os medicamentos ficam na porta da geladeira) e sossegaria. Dito e feito. Ontem rolou um blackout aqui na minha rua. Estava pintando minhas unhas de prateado quando os eletrodomésticos começaram a piscar adoidadamente e um barulhão de tensão elétrica surgiu atrás de mim. Passei por 5 segundos de terror extremo. Aí meu pai desligou aquela caixa que liga a energia da casa toda e a paz macabra reinou. Uma região todinha da minha cidade ficou no breu por umas 5 horas. Resultado: fui dormir meia-noite. MEIA-NOITE. Tá, botei o mp4 na orelha e dei a ouvir SoKo e The Who até uma da manhã quando o sono me invadiu. Acordei 3:2o da madrugada com as luzes da edícula acesas e eu achando que já era meio-dia. Levantei tropeçando nos próprios pés quando vi que tinha dormido menos que 2 horas e meia e apaguei as luzes. Fui me deitar de novo. Rolava de um lado pro outro e me debatia, tirei uma coberta e depois mais outra, passei frio e coloquei a rosa de novo. Levantei e bebi água. Levantei e fiz xixi. 4:30h. Levantei e procurei dramin. Tinha acabado. Comecei a surtar com as coisas que acontecem comigo e pensar bosta. Fui jogar Snake no meu celular (sou old school). 5:40h. Comecei a fazer birra mental porque queria muito dormir. Rolava tanto que desencapei o colchão. 6:30h. Bebi água e tirei o aparelho dental pra dar uma arejada. 8h. Minha mãe abre a porta do meu quarto antes de ir trabalhar. De repente dormi de novo. 11:23h. Acordei.

E hoje à tarde tentei dormir de novo: sem sucesso. Tô com algum problema.

Hoje não tô muito a fim de socializar com as pessoas, nem de responder scraps e nem de ver filme. Tô com dor de estômago e uma leve cólica. Tô com sono existencial e ainda não arrumei a minha cama.

É, sou cheia de emoções, minha gente.

20.8.09

Frankly, dear

I'm forced to give up, I tried my hand and now I've had enough.
Even though we have to say goodbye, keep me in mind.

18.8.09

Alpiste

Eu não tenho a ambição do ser errante de ser lida e compreendida. Ah, não. Eu tenho aquela velha vontade de encontrar uma mão quando juntos as minha sobre minha face comprimindo o ar que me invade.
Às vezes me assola o triste vazio do silêncio, o fantasma da solidão. Mas eu não tenho a vaidade de querer uma vida diferente, eu só queria algum sorriso mesmo que de improviso perdido na escuridão.
Quando eu tomo banho a água escorre pelo meu corpo de uma maneira dolorosa e fria, será um problema só meu? As páginas dos livros dançam para mim, as músicas destonam por brincadeira e a televisão insiste em chiar. Parece implicância comigo.
Não entendo a sanidade daqueles que acordam cedo e conseguem se calar, não entendo como as bolsas das mulheres estão sempre tão cheias e a cabeça daqueles meninos conseguem dizer coisas tão bonitas. Eu não entendo como algumas meninas são tão mulheres e pra elas é reservado tanto amor e volúpia.
A culpa não é da minha tv errante e nem do horário que eu vou me deitar. A culpa não são os jogos imbecis que matam meu tempo, não são os livros que não li e nem os filmes que eu não sei resumir. A culpa é essa cabeça aguçada que se adapta de uma maneira distinta a cada situação. A culpa são desses tantos eus que me habitam e fazem de mim escrava das minhas próprias palavras. Se errei, foi pela boca. Muitas vezes o corpo permite mas a garganta quer que tudo se acabe.
Eu não tenho aquele desejo de ser feliz plenamente e nem vou fazer de tudo para conhecer Paris e me casar de branco. Eu só queria ter alguém que fizesse o trânsito parecer piada, alguém que colocasse as mãos sobre os meus ombros quando caminhasse comigo na rua, alguém que entendesse de loucura e juventude, alguém que cantasse o Brasil e o universo e que bebesse coca-cola na minha rapidez. Eu queria um encaixe e não precisa ser perfeito.
Mas eu também não tenho a ambição do ser sonhador de acreditar que nasci pra esse tipo de coisa. Eu sei que pra mim resta o pó, resta a dor e o sangue seco. Eu sei que poderei rir mais vezes e sentir meu corpo flutuar pelos céus. Eu vou provar do amargo e do doce por diversas vezes mas não vou chegar a não me importar com a morte.
Eu não levanto algumas bandeiras, eu minto, eu falho... Mas ajo por mim, porque estou só nessa luta. Vou me candidatar a presidente do clube dos sem explicação, daqueles que querem dizer e não sabem como, aqueles que têm tanto amor e não têm pra quem distribuir, daqueles que sentem de longe o cheiro do fracasso e acabam por se destruir.
Esse texto talvez não faça muito sentido amanhã, ou pra você. É que é um vômito luminoso dessa dor de cabeça que eu estou.
Eu não valho a pena porque não confio em mim, porque estou enlouquecendo. É tão claro notar, é tão fácil detectar a minha insanidade. Vocês se cegaram pra mim, filhas da puta.

Do Michaelis

solidão
so.li.dão
sf (lat solitudine) 1 Condição, estado de quem está desacompanhado ou só. 2 Lugar ermo, retiro. 3 Apartamento, isolamento. 4 Caráter dos lugares ermos, solitários.

letargia
le.tar.gi.a
sf (gr lethargía) 1 Med Sonolência mórbida. 2 Estado de sono profundo que se observa em várias doenças mentais e principalmente na doença do sono. 3 Estado de vida latente em que caem certos animais, relacionado com as estações ou em consequência de uma forte dissecação. 4 Estado de inércia ou indiferença; apatia. 5 Indolência, preguiça. 6 Estado de insensibilidade que constitui um dos passos do chamado transe mediúnico. L. africana ou l. dos negros: doença do sono.

17.8.09

De mim

Eu sou dourada, eu sou um herpes
Eu sou gigante, eu sou um Hércules
Eu sou o fim, eu sou buraco
Eu sou sujeira, eu sou um trapo

Ninguém se importa quando eu não estou
Ninguém me cobre dos raios de Sol
O teto de zinco apodrecido
Deixa passar o medo e o perigo

Chafurdando no lixo úmido que me cerca
Alimento-me do podre que resta
Ninguém me amamenta quando eu nasço
A Lua se parece com uma lasca de aço

Eu sou poesia, eu sou mitológica
Eu sou vadia, eu sou ilógica
Eu sou cordeiro, eu sou sagrada
Eu sou rebanho, eu sou boiada

Juntando as mãos à altura dos olhos
A visão aguça e a mente se enquadra
Ninguém reza quando me vê delirar
Ninguém chora quando me vê mofar

A almofada é roxa e perfumada
E os ombros parecem querer se colar
Ninguém ri quando o vê o dia incendiar
O guarda-chuva faz o fogo desviar

Eu sou pedaço, eu sou cerne
Eu sou sólida, eu sou um verme
Eu sou roída, eu sou porosa
Eu sou doença, sou venenosa

16.8.09

Morte Morrida


Não quero mais a problemática, a didática e a teoria de não ser estática
Não quero mais planos, nem ciclanos e nem arcanjos a me esperar
Hoje eu não quis comer, não quis acordar, não quis conversar
Eu não precisei de folga, não preciso de cérebro, não quero me movimentar
Eu nem ao menos quero um canto, não quero um encanto e nem há espanto em não desejar
Pra quem não tem vida, não há bebida e nem formicida que cure a insaciedade de estar acordado
É uma inanição que não envolve estômago, que envolve a vontade de se ausentar
É Alice morrendo, Alice escorrendo por entre os dedos tortos e o punho cerrado
Uma vontade nula de ter um motivo para se emocionar
É a morte morrida, por mais piada que possa soar.


12.8.09

Até quando?

Hoje não venho chorando e surtando no fundo do poço te entregar palavras doídas e encharcadas de água negra. Só venho, no momento mais sincero que meu coração já pôde se encontrar, perguntar-te: até quando?
Sério mesmo. Até quando vai ser isso? Como vou viver sem te ver? Faço o diabo para te evitar, mas quando acontece volta tudo, tira-me do eixo, acaba com a minha razão, minha estrutura.
Eu tenho ciúmes de você. Eu tenho ódio de você. Eu tenho tudo relativo a você. Eu só não tenho você e nunca vou ter. Mas até quando eu vou viver com esse vazio?
Eu peço a tua ajuda.


Só quero deixar uma frase do Bukowski que muito lembra o que passo por você:

"Não sei quanto às outras pessoas, mas quando me abaixo para colocar os sapatos de manhã, penso, Deus Todo-Poderoso, o que mais agora?"



Entende?

10.8.09

Des-oito

Estou aqui, enrolada numa coberta - coisa que fiz várias vezes esse ano - e ouvindo Los Hermanos - coisa que não fiz muito esse ano - e analisando os fatos. Analisando os dezoito anos.
Sabe, as comemorações não foram assim tão calorosas, mas as pessoas que estavam perto de mim não poderiam ter sido melhores. Não poderiam.
Não vou ficar relatando o que aconteceu, porque, sentimental como sou, guardei já tudo aqui dentro do meu peito. Mas na virada do dia 9 para o dia 10 eu estava do lado das duas pessoas mais antagônicas na história de Luciana. Assim, não dava pra ter sido mais luciânico. Foi cabalístico, como gosto de dizer, e foi estranho. Talvez eu tenha descoberto forças que eu não sabia que existiam, firmei meus desejos e metas pra esse ano, entendi bem outras coisas e desejei bem firme que tudo continue sendo brilhante. Além de ganhar uns presentinhos da Nate e uma romã meio podre do Fê.
Mas bem, foi interessante. Eu sou desse tipo de pessoa noiada que fica "parando pra pensar" quando se encontra em situações marcantes... Como seu aniversário de 18 anos.
Fiquei olhando ao redor... Eu tava ali, sabe. Ali onde achei que nunca estaria, rolou até de eu dizer o que eu pensava deles, por isso firmarei aqui de novo: eu amo vocês. Obrigada por me darem os extremos de minha vida. Obrigada por me fazerem sentir a maior dor de todas, por me trazerem o nirvana, por me fazer rir e sorrir, por terem esse descompromisso compromissado comigo. Eu realmente amo vocês e espero que me amem também.
No mais parei pra entender o que são esses 18 anos. Eu não sou madura, dá nem pra eu mentir uma merda dessas, né? Mas eu acho que aprendi muita coisa nesse ano. Gosto muito de repetir (até mesmo dentro desse post) que passei pelos extremos esse ano - quero nem entrar em detalhes - e sinto que ainda há muito por vir. Muito.
Esses 18 anos estão mais pra Des-oito... Jeito de saindo da infância, acordando pra vida, absorvendo o amor... Entendendo que quem controla as coisas aqui sou eu, e eu sou a dona da história. Compreender isso tem me fazendo virar gente.
Agora vou dar um tempo na confusão e um tempo pro coração. Eu preciso respirar, preciso acalmar. Depois dessa tempestade que se foi, tem aquele arco-íris malandro esperando na alvorada. Pode crer que eu espero isso.

No mais, obrigada meus amigos de sempre, meus amigos de hoje, meus amigos que se foram.
Como Danylo bem disse, que vocês entendam e até mesmo se apaixonem pelos meus dramas e minha excêntricidade. É isso que espero.
E que mais pessoas possam me dar o presente lindo que o Greg me deu de dizer que sou o achado dele desse ano. (Lindo, né?)

Tô crescendo, galera. Be careful.

7.8.09

Merda de Vida - pt I

Merda de vida. Quando eu disse prá Mariana que eu ia embora, ela riu da minha cara como se eu tivesse falando a porra de uma piada. O que detesto é quando vem esse moralismo barato de dizer que eu tenho que aguentar as coisas. Aguentar é o caralho.

Eu tava fazendo um miojo quando minha mãe chegou e ficou me olhando quase um minuto, eu já tava puta porque não tinha conseguido o emprego no bar da Inferno’s e não deu pra fingir que aquilo não tava irritando:

- Que foi?

- Ah, Alice... Nem pra bar você funciona.

Eu não soube o que concluir primeiro. “Funciona”. Que porra é funcionar prá minha mãe? E outra... Quem deu o direito dela concluir alguma coisa de eu não passar nessa entrevista? Fiquei uns 10 segundos olhando a cara de asco que ela tava e o sangue foi subindo...

- Vai tomar no seu cu.

Eu saí da cozinha e só fui ouvindo os gritos dela abafados pelo choro entrando por debaixo da porta do meu quarto. Prá ser uma filha da puta eu funciono muito bem... Até pensei em dizer isso, mas o ódio era tanto que a garganta se fechou.

Sempre foi assim, sabe. Eu era uma aluna exemplar, por mais que seja difícil de acreditar, mas o que me fodeu foi a Rafaela. A Rafa não, né... A morte dela. Quando eu fiz doze anos ela morreu num acidente de carro voltando de São Paulo com a companhia de balé. Mas eu não posso reclamar da pressão que a perfeição da Rafaela fazia em mim, ela era uma menina bonita de 16 anos e se eu tivesse aquelas pernas que ela tinha, que eu não tive até hoje, também seria uma dessas meninas Britney Spears na fase virgem. O punk é que ela era minha irmã e eu não consegui suprir a falta que ela fez aos meus pais... Na verdade ela faz falta até hoje. Eu não dei esses orgulhos imbecis a eles e tenho certeza que ela poderia ter dado. Eu tranquei minha faculdade de jornalismo, não trouxe namorado em casa, já fui pega com tóxicos (pra ser menos trágica)... Seriam coisas transponíveis se a minha irmã estivesse aqui ainda. Mas ela não ta há 7 anos e eu não posso mais suportar viver nessa condição dupla de existência – sendo que não cumpro nem o papel da minha vida.

A Mariana é uma garota que eu conheci na época que eu tava viciada em Stooges, um ano depois que a Rafa se foi. O pai dela tinha uma banda cover dos caras e vivia me ensinando a tocar bateria. Quando eu ia à casa deles era tudo legal. Ela tinha uns 10 cachorros e todo mundo colava o que quisesse na parede... Fotos, pôsteres, recados, bulas de remédio, matérias de jornais, capas de disco... Tudo. Aconteceu que quando a Mari fez 15 anos os pais dela se separaram e o pai foi chamado pra produzir uma banda lá em Niterói e ela teria que se mudar de Londrina. Como a Mari gostava daqui e tinha vários amigos, ela ficou com a Solange, a mãe dela. A Solange era um demônio em forma de mulher. A menina virou uma otária igual aos outras garotas daqui. Nem saía mais comigo, não ia em casa ouvir música, eu não ia lá ver filme. A gente continuou amiga e tudo, mas os 2 anos anteriores foram muito melhores do que todo os outros até hoje em dia, que a gente tá com 19.

Bom, mas foi essa Mariana aí que quando me encontrou no mercado foi a primeira a saber que eu iria prá São Paulo. Ela me viu e deu um sorrisinho meio amarelo porque tava com o namorado em punho. Mas acho que ela pensou ser meio “de mau tom” não ir até lá cumprir os protocolos sociais.

- Oi, Alice! E aí, menina, como você tá?

- Ô, Mari. Eu tô bem e você?

- Ah, tô indo, né... Fiquei sabendo que você parou de fazer a faculdade, que foi?

- Eu cansei, meu... Tô indo pra São Paulo.

Acho que a filha da puta da Mariana tava muito 13 anos pra eu ter dito assim tão livre que ia me mudar. Sei que ela deu uma risada bem alta e quando viu que eu ainda tava séria emendou qualquer coisa pra cobrir a gafe.

- São Paulo, Alice? Vai fazer faculdade, arrumou trabalho?

Eu nem pensei em mentir, queria que se fodesse mesmo.

- Não. Na verdade eu to indo porque tô desempregada. Eu tentei pegar o bar da Inferno’s mas não deu, eles queriam alguém com experiência na noite. Eu cansei daqui, Mari.

- Mas São Paulo não é brincadeira, cara... Você deveria aguentar um pouco.

- E eu não sei, Mari? Não é questão de chamar atenção, é que eu realmente preciso sair daqui. Eu conheço os meus limites, meu.

- Entendo.

- Entende?

- Pelo menos sei como funciona... O Rogério, amigo do meu namorado, vai pra lá no domingo. Tá indo com uma graninha escassa também. A namorada engravidou quando ele tava fazendo intercâmbio nos Estados Unidos, chegou aqui ela tava morando com um cara há uns 3 meses. Foi foda, mas ele ta querendo se reconstruir lá...

- Porra, e eu achando que tava fodida...

- Você é rebelde, Alice! Parece que tem fogo no rabo.

- Eu sou sonhadora, Má. Sempre fui.

- Sei bem. Quer o telefone do Rogério? Talvez vocês até podem combinar de ir juntos e tal. Se quiser eu peço pro Tales agora mesmo...

- Pô, pode ser.

Aí ela pediu pro “bebezinho” arrumar o telefone desse cara pra mim. Ela me deu um abraço bem forte, pediu pra eu mandar e-mail caso precisasse de grana que ela daria um jeito e me deu umas referências em São Paulo de uns lugares onde os primos dela frequentam. Eu achei meio exagerado porque faziam uns 2 meses que ela não parava prá falar comigo. Acho que a noção de eu estar indo embora fez com que ela entendesse que eu já não pertencia mais a ela por completo e que isso não tinha volta.

Mas o que importa mesmo é que agora eu tô na rodoviária com um papel escrito “ROGÉRIO” na mão e 200 reais na carteira. Eu vou pra São Paulo.

2.8.09

Sobre como a vida deve seguir

Depois de muito pensar, analisar, sonhar, vadiar e confabular - eis aqui um lindo verbo - constatei como a vida deve seguir. E minha conclusão se resume nisso: a vida não deve seguir. Por que é que encaramos a vida como uma estrada? Ela não é e nem se parece com uma. Estradas têm fim, tem sinalizações e, mesmo que esburacadas, têm estruturas iguais umas das outras. Já a minha vida não se parece com a de vocês, tenho essa certeza. Ela não é linear - o que na maioria das vezes é bom - e não tem um destino certo... Mas não é tão incerto assim. Entende como é complexo?
Acho que a vida não deve seguir, deve acontecer... Seguir é dar continuidade a algo reto, simples. Acontecer é renovar, é surpreender. Ora, ao dirigir numa estrada você tem duas opções: ser cauteloso ou não. Antes a vida nos trouxesse duas facetas, não? Diferente da metáfora, viver é lidar com contradições gritantes, dicotomias dolorosas e decisões no mínimo difíceis. Bom, acho que ficou um pouco confuso de entender novamente.
Digo que seguir a vida como uma estrada é querer ter um fim e viver é bem mais que isso... É achar o fim assim sem querer, sem cumprir protocolos sociais, como diria o Junior.
Bom, eu tô pensando seriamente em viver... Mas isso é uma concepção minha, vocês podem pegar seus carros e ir pr'onde quiserem. Eu não tenho medo de multa.