26.4.10

A minha

Nasceu forjada no ouro e no aço, pálida, com duas pérolas enormes cravadas no rosto. Não se sabe ao certo se era manhã, tarde ou noite e se chovia ou fazia sol. Mas era novembro. Sabe-se que as árvores curvaram ao primeiro balbuciar daquela que vinha, as águas pararam de rolar. Saiu do ventre e gargalhou. Tudo era som. Junto dela nascera a energia, irmã siamesa de coração, dentro dela.
Filha da liberdade com o sonho, mastigava o mundo toda manhã. Quando as asas surgiram, começou a dar voos rasos, flutuava. Hoje paira pelo espaço. Foi bem no primeiro ano de idade que conheceu o sorriso e viraram grandes amigos, inseparáveis. Ao passar dos anos começou a ajudar as pessoas junto da felicidade, descobriu que seu abraço salvava vidas e sua voz era capaz de curar o mais definhante dos seres. Há quem diga que puxou o devaneio pelo braço quando ele estava à beira do precipício. Sem saber que era heroísmo, foi lá e fez. E saiu andando.
De seus cabelos foram feitos fios pra fazer poesia. Foi assim que ensinou a tecer. Quando encontrou a amizade, ensinou-a a coser cuidadosamente uma colcha de carinho e outra de proteção; junto da irmandade cingiu os furos do coração. Depois que foi embora, fez a saudade tecer um delicado véu de lágrimas que usa antes de amanhecer.
Dos seus olhos jorram amor, os seus braços são conforto. Cada vez que sorri, vê-se um clarão ao longe, um guia na escuridão. Do seu coração brotam flores onde deitam os desabrigados e a inocência descansa à sombra da hombridade.
A minha, pequena e perfumada, de pseudônimo insanidade e sobrenome luz. A minha que viverá 500 anos, mesmo que se houver só ela, só folha e brisa, que só houver amor e vácuo. A minha, ensaiando um grito ensurdecedor, bonito, eterno, que ecoe no ouvido daquele que for livre.
A minha, só ela.

À minha, a minha, minha Nate. Minha querida amiga.

19.4.10

Estranha Mania


Eu tenho uma estranha mania de querer cuidar dos outros. Mesmo sabendo que não querem que eu cuide. Mesmo sabendo que não sabem ser cuidados. Mesmo sabendo que não ligam para isso. Mesmo sabendo que não ligam para mim.
Eu tenho um estranho desejo de vê-lo dormindo, de cheirar a sua roupa e te despertar na hora certa. Eu tenho vontade de acompanhar alguns passos e de respirar compassado.
Eu queria ser seu chá quente, sua fumaça pesada e o descansar na tarde fria. Queria ser sua, mesmo que você não fosse meu.

18.4.10

Paulada

amor hoje
ontem café
na sala de estar
estou
em pé

amor hoje
amanhã talvez
o meu coração
tem fundo
xadrez

amor hoje
nunca se sente
o diabo me tenta
não
tente

amor agora
sempre assim
se digo não
digo
sim

10.4.10

Caiando

Esse seu cheiro de roupa limpa ainda vai nos levar para algum lugar onde táxi nenhum poderá nos buscar ao meio-dia e meia aos pés de Santo Antônio onde levei uma rosa amarela do quintal seu.

4.4.10

Barro

Meus pés estão sujos de um barro vermelho e gelado, no meu rosto está o mais sincero sorriso que dei nesse ano. Nesses dois anos. Três.
Hoje meu texto será para brindar a alegria de estar viva. Será em memória de tempos negros que jamais voltarão, será em homenagem ao sorriso da Natália, ao abraço do Gregory e ao jeito esquisito e doce do Felipe. Será pela música boa, pela bebida gelada, pela náusea e as risadas esquizofrênicas. Pela Nayara no posto de gasolina, pelo cabelo úmido, pela Cláudia amada e as pessoas ao redor. Dedico essas palavras à Elaine, irmã que escolheram pra mim e não podiam ter feito melhor. Pelo chão que comporta nosso peso e o céu sempre a vigiar. Pelo tapete de luzes e a mãe do firmamento. Pelas pernas que nos sustentam e as mãos sempre tão vivas. Isso é por Londrina estar me esperando, pelo beijo e o abraço quente. Pelo prazer e o vinho barato. Pelo mal que não quero e não faço mais questão. Por tudo que era errado e a mim não pertence mais. Pela vida estar caminhando como eu sempre quis, pela insanidade e simplicidade dos dias que vem vindo. Por eu conseguir deixar pra depois e soltar esse amor pra fora. Amar, amar e amar, sem colher de volta. Dar amor, não emprestar. Viver, velho. É por viver.
Eu escrevo tudo isso em homenagem à vida, à minha vida. À vida dos meus pais, dos amigos, dos conhecidos e de quem está a me esperar lá do outro lado. Eu não fui embora da minha terra, eu ganhei mais uma. Eu tenho amor em todo canto, eu vou viver de amor porque aprendi a amar essa vida. Aprendi a me amar. Eu escrevo em homenagem ao amor, e é amor que desejo a vocês que estavam comigo agora. Amor, velho. Era disso que eu falava o tempo todo.
Meus pés estão sujos de um barro gelado e vermelho e eu não quero lavá-los nunca mais.