17.9.10

Sobre o que tem acontecido

Não me lembro que dia foi, mas esses dias a minha mãe me ligou quando eu estava dentro do 307 indo para UEL. Ando bem esquecida, mas me recordo de estar um pouco atrasada para aula do Bola. "É, filha, o primo piorou", foi o que ela disse de início. Eu senti uma fincada na nuca e as pernas amolecendo. Eu estava em pé próxima à porta e a vontade na hora foi de arrombá-la com o pés e, sei lá, sair correndo. O primo piorou. O câncer voltou e voltou violento. As dores absurdas nas costas já anunciavam o pior e todo mundo respirou bem fundo antes dessa notícia. Sim, o câncer voltou.
Esses dias têm sido estranhos. Domingo comecei a somatizar as coisas erradas mas, repito, tenho estado confusa com datas. Não sei se foi após esse telefonema que o resto desandou ou se estava desandado e eu parei para pensar só nesse momento. Não importa. O que tem acontecido é que as coisas estão muito erradas. Tenho dormido mal e não tenho vontade alguma de acordar. Meu curso me enoja e meu trabalho me enche o saco. Tudo fica ainda mais doloroso porque eu sei que aqui em casa as coisas não andam nada bem.
Paira sobre mim uma grande culpa por ter ido embora contra a vontade dos meus pais. Talvez eles precisem de mim nessa hora de aflição. Mas, acima de tudo, tenho precisado deles. De ouví-los lavando a louça e fazendo comentários desconexos sobre qualquer coisa. E não é uma saudade comum. É uma dor por ser uma filha ausente. Uma dor por estar perdendo um primo e estar longe cuidando de um monte de coisa que eu não gostaria de cuidar.
O primo está com dores, toma bastante morfina. Está menos pálido e muito magro, os ossos estão visíveis e o machucam. O câncer se alastrou como uma praga - pensando bem, câncer é uma praga. Hoje os médicos desiludiram a família. Apesar de tudo, está lúcido, embora esquecido. Quer sarar ou ir embora logo, permite-nos chorar e não sente fome. A tia está desesperada, revoltada. Dessa vez parece que não tem saída e eu só entendi a dimensão disso aqui em Apucarana. Vejo meu pai como nunca vi, os olhos molhados e sem muita piada. A mãe chora o tempo todo, não costuma esconder nada mesmo. Escondemos um do outro o que estamos sentido, mas toda hora escapa uma palavra e já falamos dele, de como isso dói.
Eu, já de saco cheio de tudo, fico sem saída. Não há nada que eu possa fazer, nada mesmo. Nem ao lado da família posso estar. Mas dói muito. Não sou a prima mais ligada a ele, nunca tivemos tanta intimidade. Mas quando ele se curou da primeira vez, me deu um novo sentido às coisas. Meu herói. Curou-se de três tipos de câncer e teve um Natal só para ele. Um Natal tão lindo que eu nunca vou me esquecer. A família toda numa felicidade absurda, celebrando a vida que tinha retornado a ele. Parecia que havia sido uma prova, sabe? Que, pronto, ele e nós aprendemos a lição.
Nada disso. Ele está mais doente que da outra vez, nós estamos descrentes, clamando por uma fé que poucos de nós têm. Eu mesma não tenho. Sei lá, eu sou bem egoísta mesmo. Mesmo pensando nos pais dele, nos meus pais, no restante da família, penso em mim. Como vou ficar se o pior acontecer. Porque eu não aceito a morte e nunca vou aceitar. Porque sei que é a ordem das coisas, mas não aceito que aos 22 alguém tenha que dar fim a essa progressão. Eu não aceito.
Hoje meu coração sangra de cansaço, medo, dor, saudade. Hoje estou confusa. É o que tem acontecido. Preciso de férias da vida, preciso do Danylo o tempo todo, preciso passar uns dias em Apucarana. Acima de qualquer coisa, preciso de um milagre que salve a vida do José Eduardo. Do Zuido. Do Dudé.

Esse é o meu desabafo sobre o que tem acontecido.

2 comentários:

  1. Bem, uma situação assim é MUITO complicada, ainda mais sabendo que não a primeira vez que isso acontece.
    Sou péssimo em tentar confortar os outros, mas, por mais distante que possamos estar, gostaria muito de poder ajudar.

    Enfim, muita força pra você, e ainda mais força pra ele!
    Fique bem!

    ResponderExcluir
  2. Nem sei o que dizer, mas senti algo que me mandou escrever aqui, sabe? Ler de novo seu blog, acompanhar sua vida - que me é muito importante, você deve saber.
    Gostaria de falar algo que te consolasse, que te acalmasse, que acalmasse a todos - mesmo que eu não os conheça -, mas acho que não tenho. O que tenho pra dizer é pouco: Tenham fé. Se for pra ele sair dessa, ele vai sair. Se não, não - acho que ninguém merece uma vida temerosa e limitada, é bom beber o bem direto da fonte.

    Te amo e te quero bem.

    ResponderExcluir